A promotora de Justiça Cláudia do Amaral Calmon, assessora da Coordenadoria Geral do MP, participou de uma audiência pública promovida pela Comissão Especial da Câmara dos Deputados que analisa o Projeto de Lei nº 6.670/2016 (PL 6670), cuja finalidade é instituir a Política Nacional de Redução de Agrotóxicos – PNARA. O evento aconteceu no auditório da Administração Estadual do Meio Ambiente (ADEMA), reunindo representantes de entidades, de órgãos públicos, de movimentos sociais e cidadãos interessados no tema.
“O Ministério Público firmou entendimento no sentido de repudiar o Projeto de Lei n° 6.299/2002, conhecido como ‘Pacote do Veneno’, que visa flexibilizar a comercialização e o uso de agrotóxicos no Brasil. Ao mesmo tempo, manifestamos apoio à Política Nacional de Redução de Agrotóxicos (PNARA), esboçada no Projeto de Lei n° 6.670/2016”, disse Cláudia Calmon, que também representava o subprocurador-geral do Ministério Público do Trabalho, Pedro Serafim, coordenador do Fórum Nacional de Combate aos Agrotóxicos. Na ocasião, ela falou sobre a Moção de Repúdio elaborada pela Comissão Permanente do Meio Ambiente, Habitação, Urbanismo e Patrimônio Cultural (COPEMA) do Grupo Nacional de Direitos Humanos (GNDH) – órgão integrante do Conselho Nacional de Procuradores-Gerais dos Ministérios Públicos dos Estados e da União (CNPG). O documento tem 15 laudas e vasta fundamentação científica.
De acordo com a COPEMA, o Pacote do Veneno privilegia “o interesse de grandes empresas da indústria química e do agronegócio em profundo desprezo ao conhecimento técnico-científico produzido e ao clamor da população brasileira, externado por meio de manifestações de diversas entidades, em flagrante desrespeito aos direitos constitucionais resguardados pela Carta Magna de 1988”. O projeto é uma compilação de 29 propostas legislativas com várias sugestões para alterar a Lei nº 7.802/1989, que regula tudo o que se refere aos agrotóxicos no Brasil. Sob o argumento da desburocratização e da modernização legislativa, entre outras mudanças, os defensores do PL 6.299/2002 querem substituir o termo “agrotóxico” por “pesticida”, além de concentrar poderes para a aprovação de novas substâncias no Ministério da Agricultura. Atualmente, o processo de autorização de uso envolve também os Ministérios da Saúde e do Meio Ambiente.
Segundo matéria publicada em 2015 pelo Jornal El País, “o alarmante uso de agrotóxicos atinge 70% dos alimentos”. Somos o país que mais consome pesticidas no mundo. Cada brasileiro ingere, em média, 5 litros de veneno por ano (dados do Instituto Nacional do Câncer, que também tem posição firmada contra o PL 6.299). Em julho deste ano, o mesmo El País noticiou “a operação para afrouxar ainda mais a lei, na contramão do mundo”, tornando mais célere a permissão de novos produtos e simplificando a classificação de risco. Dados da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC) apontam um aumento de 288% no uso de agrotóxicos entre os anos de 2000 e 2012. Já a Associação Brasileira de Saúde Coletiva (ABRASCO), informa que 22 dos 50 agrotóxicos utilizados no Brasil são proibidos na Europa.
O contraponto ao Pacote do Veneno (PL 6.299) já tramita na Câmara Federal. É o PL 6.670/2016, que propõe a criação da Política Nacional de Redução de Agrotóxicos – PNARA. Trata-se de um projeto de iniciativa popular, mobilizado pela ABRASCO e defendido por instituições como o Ministério Público. O objetivo é implementar ações que contribuam para a redução progressiva do uso de agrotóxicos na produção agrícola, pecuária, extrativista e nas práticas de manejo dos recursos naturais, com ampliação da oferta de insumos de origens biológicas e naturais, contribuindo para a promoção da saúde e sustentabilidade ambiental, com a produção de alimentos saudáveis.
Em entrevista, a promotora de Justiça Cláudia Calmon destacou o trabalho que vem sendo realizado no MP de Sergipe. “Há 3 anos abraçamos essa causa. Já fizemos várias operações na região de Itabaiana, que resultou em prisões pela venda ilegal de agrotóxicos. Além disso, pactuamos Termos de Ajustamento de Conduta; tratamos sobre a logística reversa e estamos fazendo bimestralmente a coleta itinerante de embalagens de agrotóxicos”, pontuou. Além disso, por meio de audiências realizadas no Ministério Público, foram viabilizados recursos para a aquisição de um software que permitirá – num trabalho integrado entre Secretaria de Estado da Fazenda, Conselho Regional de Engenharia e Agronomia, Empresa Estadual de Desenvolvimento Agropecuário (EMDAGRO) e Associação dos Revendedores de Produtos Agropecuários (ARDASE) – acesso a todas as receitas agronômicas emitidas em Sergipe. “Assim saberemos quais agrotóxicos estão entrando no estado; em quais propriedades eles são aplicados e teremos um controle muito mais efetivo do que vem acontecendo. Paralelamente, trabalhamos para a implantação de um laboratório de análise de resíduos, a fim de que o trabalho seja mais completo”, explicou a promotora. Outra iniciativa marcante foi a realização, no último mês de junho, do seminário “Os Impactos do Uso Indiscriminado de Agrotóxicos”, com a presença de cientistas nacionalmente renomados, a exemplo da pesquisadora Larissa Mies Bombardi, da USP, que foi destaque em matéria publicada pela BBC Brasil [clique e confira].